Alegria

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quarta-feira, 2 de abril de 2014

# 030 - Bolsa de valores - André Argolo

Poema de hoje # 030
André Argolo é poeta. Foi ele que filmou a epopéia que virou comédia do nosso Pindorama. O vídeo é um show de sensibilidade e bom humor. Depois daquilo passei a olhar para ele de outro jeito. Ficamos amigos, o que para mim é uma alegria e uma honra. Agora ele me surpreende novamente com seu livro ainda não lançado Vento Noroeste. Estou lendo aos poucos, para saborear e para pensar. Vocês vão entender quando lerem esse aqui::
Bolsa de valores, André Argolo (Vento Noroeste)
Moda no último Natal:
pacotes digitais
com laços remotos
dentro, dois grandes
abraços
Não há outro presente
possível
O dinheiro venceu.
Ladrões amuados
pescam velhos anéis
em bueiros entulhados.
O governo adverte:
a crise não é de valores:
a crise é dos produtos.
Férias coletivas
praias desertas
crianças brincam
sérias nos autos
sem gasolina
pedem passagem
buzinam podres onomatopeias
- que nem papai!
não têm tempo a perder
Filas partem de guichês vazios e crescem.
Na loja de comidas
a bandeja com fígado de boi
custa duas moedas de um
mas disso a mocinha não gosta.
Não tem mais pão fofinho!
Que desastre, resmunga a velha
com marcas brancas no pescoço
e nos pulsos, bem onde antes
pendurava seus brilhos.
O papel acabou!
Ai, arde-se o homem
de terno cinza e a pasta
de couro vazia pelo tempo
sem escritório.
O ministro das contas
não poupa palavras
de confortos móveis ou
imóveis em promoção.
Aos poucos, melhoramos
dizem ex-presidentes
em cadeia nacional
Garota grávida disputa preferência
no espaço preferencial
afunda o nariz do cadeirante
a cotovelada é abissal
São profundas as semelhanças.
Polícia tranquiliza:
sinais de impaciência
não surgem por aí
sem vacina.
A mãe de um viciado
em remédios para dormir
engarrafa o sangue do filho
com sabor artificial de maracujá.
Aguarda-se o avanço da tecnologia:
Correção automática de caras feias
sorrisos recortados
que não recordem datas
enquanto
houver energia
nas paredes estufadas
e os bons dias não saírem
para tomar chuva
e os pedidos de socorro
não gritarem por cartazes
colados em velhos postes
cada um com seu
cachorrinho
atado pela coleira
no osso.

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