Alegria

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quarta-feira, 2 de abril de 2014

# 033 - Explicação - Carlos Drummond de Andrade

Poema de hoje # 033
Este nosso modesto e singelo grupo de poetas dispostos a compartilhar belezas, surgiu de um maravilhoso sarau Drummond feito no Imaculada Bar-Galeria Rio pela incomparável poeta, atriz, agitadora cultural Kyvia Rodrigues, em um já mitológico dia de fevereiro. Na companhia do amigo poeta Andre Argolo, do vulcão de vida e modéstia a parte meu amigoTheou Cunha e do meu filho amado (ele vai odiar que eu diga isso em público) Heitor Alvito, tivemos uma noite de sonho, feliz, feliz. Daí nasceu o Poema de hoje e para comemorar nosso primeiro mês de existência, o (ir)responsável pelo grupo resolveu decretar (rsrs) 5 dias de Drummond e estamos conversados .
Para falar a verdade: o sujeito está viajando e na impossibilidade de levar seus livrinhos de poesia, meteu a mão em três volumes com a poesia completa de Drummond pra servir de (boa) companhia...
Começo com um poema do primeiro livro (Alguma Poesia), em que Carlos explica o que é ser poeta para ele, e quem há de discordar, não é?
Explicação, Carlos Drummond de Andrade (Nova Reunião, 23 livros de poesia, volume 1)
Meu verso é minha consolação
Meu verso é minha cachaça. Todo mundo tem sua cachaça.
Para beber, copo de cristal, canequinha de folha de flandres,
folha de taioba, pouco importa: tudo serve.
Para louvar a Deus como para aliviar o peito,
queixar o desprezo da morena, cantar minha vida e trabalhos
é que faço meu verso E meu verso me agrada.
Meu verso me agrada sempre…
Ele às vezes tem o ar sem-vergonha de quem vai dar uma cambalhota,
Mas não é para o público, é para mim mesmo essa cambalhota.
Eu bem me entendo.
Não sou alegre. Sou até muito triste.
A culpa é da sombra das bananeiras de meu país, esta sombra mole, [preguiçosa.
Há dias em que ando na rua de olhos baixos
para que ninguém desconfie, ninguém perceba
que passei a noite inteira chorando.
Estou no cinema vendo fita de Hoot Gibson,
de repente ouço a voz de uma viola…
saio desanimado.
Ah, ser filho de fazendeiro!
À beira do São Francisco, do Paraíba ou de quaquer córrego vagabundo,
é sempre a mesma sen-si-bi-li-da-de
E a gente viajando na pátria sente saudades da pátria.
Aquela casa de nove andares comerciais
é muito interessante.
A casa colonial da fazenda também era…
no elevador penso na roça,
na roça penso no elevador.
Quem me fez assim foi minha gente e minha terra
e eu hosto bem de ter nascido com essa tara.
Para mim, de todas as burrices, a maior é suspirar pela Europa
A Europa é uma cidade muito velha onde só fazem caso de dinheiro
e tem umas atrizes de pernas adjetivas que passam a perna na gente.
O francés, o italiano, o judeu falam uma língua de farrapos.
Aqui ao menos a gente sabe que tudo é uma canalha só,
lê seu jornal, mete a língua no governo,
queixa-se da vida (a vida está tão cara)
e no fim dá certo.
Se meu verso não deu certo, foi seu ouvido que entortou.
Eu não disse ao senhor que não sou senão poeta?

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