Poema de hoje # 033
Este nosso modesto e singelo grupo de poetas dispostos a compartilhar belezas, surgiu de um maravilhoso sarau Drummond feito no Imaculada Bar-Galeria Rio pela incomparável poeta, atriz, agitadora cultural Kyvia Rodrigues, em um já mitológico dia de fevereiro. Na companhia do amigo poeta Andre Argolo, do vulcão de vida e modéstia a parte meu amigoTheou Cunha e do meu filho amado (ele vai odiar que eu diga isso em público) Heitor Alvito, tivemos uma noite de sonho, feliz, feliz. Daí nasceu o Poema de hoje e para comemorar nosso primeiro mês de existência, o (ir)responsável pelo grupo resolveu decretar (rsrs) 5 dias de Drummond e estamos conversados .
Para falar a verdade: o sujeito está viajando e na impossibilidade de levar seus livrinhos de poesia, meteu a mão em três volumes com a poesia completa de Drummond pra servir de (boa) companhia...
Começo com um poema do primeiro livro (Alguma Poesia), em que Carlos explica o que é ser poeta para ele, e quem há de discordar, não é?
Explicação, Carlos Drummond de Andrade (Nova Reunião, 23 livros de poesia, volume 1)
Meu verso é minha consolação
Meu verso é minha cachaça. Todo mundo tem sua cachaça.
Para beber, copo de cristal, canequinha de folha de flandres,
folha de taioba, pouco importa: tudo serve.
Meu verso é minha cachaça. Todo mundo tem sua cachaça.
Para beber, copo de cristal, canequinha de folha de flandres,
folha de taioba, pouco importa: tudo serve.
Para louvar a Deus como para aliviar o peito,
queixar o desprezo da morena, cantar minha vida e trabalhos
é que faço meu verso E meu verso me agrada.
queixar o desprezo da morena, cantar minha vida e trabalhos
é que faço meu verso E meu verso me agrada.
Meu verso me agrada sempre…
Ele às vezes tem o ar sem-vergonha de quem vai dar uma cambalhota,
Mas não é para o público, é para mim mesmo essa cambalhota.
Eu bem me entendo.
Não sou alegre. Sou até muito triste.
A culpa é da sombra das bananeiras de meu país, esta sombra mole, [preguiçosa.
Ele às vezes tem o ar sem-vergonha de quem vai dar uma cambalhota,
Mas não é para o público, é para mim mesmo essa cambalhota.
Eu bem me entendo.
Não sou alegre. Sou até muito triste.
A culpa é da sombra das bananeiras de meu país, esta sombra mole, [preguiçosa.
Há dias em que ando na rua de olhos baixos
para que ninguém desconfie, ninguém perceba
que passei a noite inteira chorando.
Estou no cinema vendo fita de Hoot Gibson,
de repente ouço a voz de uma viola…
saio desanimado.
Ah, ser filho de fazendeiro!
À beira do São Francisco, do Paraíba ou de quaquer córrego vagabundo,
é sempre a mesma sen-si-bi-li-da-de
para que ninguém desconfie, ninguém perceba
que passei a noite inteira chorando.
Estou no cinema vendo fita de Hoot Gibson,
de repente ouço a voz de uma viola…
saio desanimado.
Ah, ser filho de fazendeiro!
À beira do São Francisco, do Paraíba ou de quaquer córrego vagabundo,
é sempre a mesma sen-si-bi-li-da-de
E a gente viajando na pátria sente saudades da pátria.
Aquela casa de nove andares comerciais
é muito interessante.
A casa colonial da fazenda também era…
no elevador penso na roça,
na roça penso no elevador.
Aquela casa de nove andares comerciais
é muito interessante.
A casa colonial da fazenda também era…
no elevador penso na roça,
na roça penso no elevador.
Quem me fez assim foi minha gente e minha terra
e eu hosto bem de ter nascido com essa tara.
Para mim, de todas as burrices, a maior é suspirar pela Europa
A Europa é uma cidade muito velha onde só fazem caso de dinheiro
e tem umas atrizes de pernas adjetivas que passam a perna na gente.
O francés, o italiano, o judeu falam uma língua de farrapos.
Aqui ao menos a gente sabe que tudo é uma canalha só,
lê seu jornal, mete a língua no governo,
queixa-se da vida (a vida está tão cara)
e no fim dá certo.
e eu hosto bem de ter nascido com essa tara.
Para mim, de todas as burrices, a maior é suspirar pela Europa
A Europa é uma cidade muito velha onde só fazem caso de dinheiro
e tem umas atrizes de pernas adjetivas que passam a perna na gente.
O francés, o italiano, o judeu falam uma língua de farrapos.
Aqui ao menos a gente sabe que tudo é uma canalha só,
lê seu jornal, mete a língua no governo,
queixa-se da vida (a vida está tão cara)
e no fim dá certo.
Se meu verso não deu certo, foi seu ouvido que entortou.
Eu não disse ao senhor que não sou senão poeta?
Eu não disse ao senhor que não sou senão poeta?
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